terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Anjo de Cristal...

*contém spoilers*

Lendo o Anjo de Cristal da Beatriz Lima (14 anos à época da sua publicação e mais jovem ainda quando o escreveu), descobri que o meu palpite acertou em certos pontos e estiraçou-se no chão noutros. Ora bem… vejamos:

Para quem não sabe a Beatriz é jovem (nasceu em 1997!) e publicou este romance pela Alphabetum edições em 2012. Acedendo ao website da editora descobri inúmeros links onde podemos acompanhar o percurso da Beatriz desde a publicação do livro, bem como a reacção da imprensa. Houve, inclusive, um convite de Moçambique para uma iniciativa cultural. Após assistir também a uma entrevista num programa com o José Figueira e outro com a Conceição Lino, considerei que tanto alarido deveria ter algum fundamento de verdade e abri o livro, lendo as primeiras cinquenta páginas em meia hora (e sem pular linhas!).

Até à página cinquenta já foi uma história de amor, uma história de amizade, uma história de guerra, uma história de caridade, uma história de violência doméstica e uma história de acção, tudo separadamente e com a mesma intensidade a cada instante. 


- O livro evidencia um défice que qualquer amante de História considerará grave no que diz respeito ao contexto político-histórico-temporal. Poderia ser passado noutro qualquer país e noutra qualquer época;

- Concordo que é difícil, sobretudo quando se é tão jovem, fazer-se uma boa pesquisa e background num romance mas, sem querer ser má - e talvez já o sendo - mas há que ser exigentes connosco próprios e, sobretudo, não tentarmos ir além dos nossos recursos. Um ponto onde teria sido fácil a autora pelo menos aproximar-nos um bocadinho de França teria sido adoptando nomes franceses. O que não é o caso.


- Todo o livro evidencia aquilo que eu própria sentia aos doze, treze anos, quando escrevia. Uma certa leveza de espírito, um certo sentido de que há coisas a fazer em que ninguém repara, a ânsia por liberdade, até o sentido maternal, o amor romântico, me parecem familiares. A autora é uma sonhadora, consigo dizê-lo e acho bonito e puro que assim seja. O livro transpira essa mesma ingenuidade e é por isso que se fala em príncipes, fadas, estrelas cadentes e as pessoas se chamam Lua, Sky ou Lírio. 


- A acção precipita-se, tudo acontece em cinco minutos e com a maior naturalidade e, mais, assegura-se genuíno. Amores, ódios, crimes. 


- Ora o narrador surge como presente, ora parece mero espectador no modo como refere as outras personagens;


- A Anne Marie é uma “mártir” com quem seria fácil simpatizar – a deixar uma criança de c. seis anos (segundo dá a entender) com um arranhão na perna dormir na sua casa duas horas depois de a conhecer, sem sequer lhe indagar o que seja a respeito dos seus pais;


- Considero as personagens estereotipadas, desadequadas do seu tempo, espaço e pressuposta cultura, com reacções exageradas e deslocadas, rotinas fúteis e eventos precipitados, pouco ponderados;

- Vírgulas separam o sujeito do verbo;

- Enredo irrealista e a puxar ao dramático sem que os acontecimentos isso justifiquem;

Review final por surgir.
Alterei a review porque o objectivo não era ferir as susceptibilidades de ninguém, nem ser "uma cabra". No entanto não posso deixar de partilhar a minha opinião.


6 comentários:

  1. Espero que a Beatriz Lia não leia este texto. É demasiado cruel!
    Choca-me e entristece-me que a Célia, uma escritora jovem e em início de carreira e, como tal ainda sem ter atingido a perfeição, se dê ao trabalho de escrever um texto tão extenso e demolidor acerca do trabalho de uma potencial e tão jovem escritora.
    E diz que ainda vai escrever mais.
    Não percebo.Se não gosta porque não desiste de ler?
    Gosto da Célia, tenho seguido o seu trabalho, por isso lamento tanto vê-la maltratar uma miúda desta maneira.
    Teresa





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    1. Cara Teresa,
      Nada do que escrevi tem por objectivo deitar a autora abaixo ou afirmar-me melhor do que ela. Recebi muitas críticas semelhantes a esta de pessoas que me fizeram o favor de me dizer que fiz 'isto' e 'aquilo' errado e que precisava de mudar. Graças a isso penso que continuarei a evoluir.

      Mas, não sendo esta leitura sobre mim, e sendo esta a "Parte I", saí de casa e deixei por escrever a parte II, onde planeio dizer que acho óptimo que a autora passe o seu tempo a escrever e queira dedicar a vida à escrita. Mas peço que me entenda também, porque esperar é uma virtude e eu também escrevi muitos romances desde os 12 anos em que uma review como aquela que encontra acima seria justa. Já disse em várias entrevistas que ainda bem que não fui publicada cedo ou teria saído algo deste género.

      Os exageros, as imperfeições, imaturidades, o próprio Português é algo que evolui muito em 10 anos quando se gosta de escrever. Penso que a autora poderia ter-se deixado crescer um bocadinho mais na escrita antes de expôr o trabalho ao mundo. Claro que as pessoas que a rodeiam devem estar orgulhosas e apoiá-la, é um feito, de facto. Mas não posso cobri-lo de elogios quando estou a ler um romance onde nem o espaço é coeso.

      Espero que, se algum dia tiver oportunidade de ler o livro, concorde comigo no sentido em que a autora deveria ter esperado e amadurecido. Ninguém lhe roubaria jamais o mérito de escrever livros aos treze anos, mas o mundo não precisava de o saber já porque pessoas como eu e outras de que tenho conhecimento têm feito isso mesmo: esperado para poder oferecer algo de melhor a quem investe tempo e dinheiro neles.

      Não vou desistir do livro porque a leitura não está a ser "dolorosa", simplesmente peca a muitos níveis. Num próprio livro pode notar-se evolução da parte do autor, principalmente quando se é jovem porque uma pessoa com treze anos e um mês ou com catorze é outra possivelmente bastante mais amadurecida e consciente do mundo ao redor. Tenho esperança de que o final me surpreenda.

      Achei que seria melhor assim do que abrir o goodreads e dar-lhe um 1 e escrever algo como "pior do que um acidente de comboio", como já tenho visto nalguns casos referentes a outros livros que não "esperaram". Espero que a Beatriz, se ler (e não faço questão disso, porque o objectivo não é atacá-la mas sim partilhar mais esta leitura convosco) entenda que, de futuro, tem de estar atenta a todos estes pontos.

      Um beijinho Teresa,
      Boas leituras :)

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  2. Maltratar?? Tem 14 anos... acham mesmo que o Saramago escrevia com esta idade? Que o Hemingway e o Kafka escreviam sobre amores aos 14 anos? O que a Célia disse aqui não foi cruel, foi uma crítica objectiva. A idade da autora não é desculpa. Não tem maturidade, não publica. O leitor não tem de a desculpar por ter 14 anos. Que pegue nas críticas e aprenda, isso sim é um autora. Se ficar triste com uma crítica onde aponta as falhas, não é uma autora, é uma pessoa que só quer palmadas nas costas -.-"

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  3. Muito obrigada, Célia pela sua resposta que me ajudou a entender a sua posição em relação à opinião que elaborou. Felicito-a também pela elegância com que o fez.
    Um beijinho
    Teresa

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    1. Fiquei triste comigo mesma, Teresa. Acho que as reviews devem ser honestas mas não quero que pense que tirei prazer de retalhar o livro ou que queria deitar a pobre rapariga por terra :(

      Suavizei-a um pouco, a fim de não parecer tão "mazinha" mas sem deixar de transmitir o que pensei.

      Beijinho,

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    2. Deixou-me sem palavras, Célia.
      Apenas lhe digo que a ADMIRO muito!
      Um beijinho

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